
As duas vidas de Câmara Pestana, em Portugal e no Itaú.
O português Carlos da Câmara Pestana construiu não uma, mas duas carreiras de sucesso, dos dois lados do Atlântico. Nascido em 27 de julho de 1931 em Paço D’Arcos, entre Lisboa e Estoril, formou-se em Direito em 1955 pela Universidade Clássica de Lisboa, mas logo se apaixonou pela economia e fez pós-graduação em ciências político-econômicas. Em 1957, aos 25 anos, foi indicado para o Ministério do Ultramar, participando das rediscussões do Mercado Comum Europeu. Em 1974, após uma carreira de 18 anos, já era presidente do maior banco de Portugal, o Banco Português do Atlântico. Era também presidente da Associação dos Bancos Portugueses. Mas sua vida mudou radicalmente naquele ano com a Revolução dos Cravos, que pôs fim à ditadura salazarista, iniciada em 1933, e levou ao poder um governo socialista. O novo governo estatizou o sistema financeiro e Câmara Pestana, temendo as perseguições que outros executivos começaram a sofrer e com a mulher grávida do sexto filho, decidiu vir para o Brasil e recomeçar a vida. Aqui, Câmara Pestana procurou inicialmente uma oportunidade no Unibanco, sem sucesso. Seu esplêndido currículo, ironicamente, dificultava uma colocação em um cargo mais modesto. Câmara Pestana fez contato então com o diretor regional do Itaú no Rio de Janeiro na época, Roberto Rocha Azevedo, que agendou uma reunião com o então presidente do banco, José Carlos Moraes Abreu. Câmara Pestana impressionou a todos com sua coragem de recomeçar no Itaú em posição muito abaixo de sua capacidade, lembra Jairo Cupertino, que se tornaria seu amigo. Começou na área comercial como chefe de departamento, cuidando de um grupo de 20 agências e em 1980, participaria da reestruturação administrativa do banco que criou a diretoria executiva e da oficialização dos princípios do Grupo Itaú, ao lado de Olavo Setubal, Moraes Abreu e Cupertino. Tornou-se depois diretor no difícil período da hiperinflação dos anos 1980. Em 1989, foi convidado por Olavo para assumir a presidência do banco, e aceitou com a condição que seria apenas para preparar Roberto Setubal para o cargo. Pouco antes da posse, em março de 1990, ele e Roberto tiveram de lidar com o Plano Collor. Em sua gestão, Câmara Pestana teve papel fundamental na preparação do banco para a queda da inflação, que veio finalmente em 1994 com o Plano Real, cortando custos e equilibrando as receitas. Também em 1994, ele transferiu a presidência do banco para Roberto Setubal e tornou-se membro do Conselho de Administração do Itaú. Em 2008, com a morte do Olavo Setubal, assumiu a Presidência do Conselho de Administração do banco, cargo que ocupou até 2009, logo após a fusão, continuando depois como membro. De 2011 a 2015, foi Presidente do Conselho de Administração da Itaúsa. Câmara Pestana voltou para Portugal, vindo ao Brasil periodicamente.